CURA QUEM TOCA E CONVENCE

Gente humilde, analfabeta, beirando os 75 anos; demasiado falante, de um sotaque carregado, que depois descobri provir de uma cidade chamada Redenção do Gurguéia, no Piauí. 
No fim da consulta, já com prescrições e orientações, a falante senhora sentiu necessidade de contar-me uma história, no intuito de me mostrar, talvez, que nem sempre nós médicos estamos certos. 
"Sentia dores há muitos anos nesse meu juei. Tinha dia que nem conseguia andar. Me arrastava pela casa. Ia no médico... e era injeção de voltaren, remédio, comprimido direto, e nada de aliviar. Perdi as conta. Diziam que eu tinha uma tal de as... as... (- Artrose, interrompi). Isso. Astroze. Mas era dor demais...
"Até que um dia passou um homem lá na rua vendendo um aparei. O moço sentou comigo, e me expricou tudim; leu os manual, com muita atenção; me perguntou um monte de coisa, tocou na minha perna, e me falou:
- Esse aparelho vai resolver todas as dores da senhora. Eu garanto. Pode confiar. Se não te ajudar, eu devolvo a dinheiro.
(Imaginei o vendedor, empático, fitando profundamente os olhos daquela senhora solitária, segurando suas mãos, tentando convencê-la de comprar o produto).
"Foi uma benção. Passo ele por aqui, por aqui... Agora tem é tempo que num sintu dor em cantu nium".
- E quanto custou o aparelho, só por curiosidade?
De soslaio, desconfiada, contestou: 
"500 reais".
Caí na gargalhada. Ela me acompanhou. 
"É meu fi. Eu num pudia tá gastando essi dinheiro, mas foi a única coisa que me ajudô".

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