DILEMA
É um senhor de 88 anos... Raramente aparece na consulta sem a companhia de sua esposa, com quem leva a vida ha mais de 50. Nunca o vi vestido com camisa que não fosse social, calça de linho, cinto e sapatos pretos – algo envelhecidos, mas sempre engraxados –, cabelos penteados, e higiene impecável. Afável e educado no trato, cordial e muito agradecido; ativo, e absolutamente lúcido.
Costuma expor suas queixas em forma de perguntas. Dessa vez, compareceu só, e com semblante de preocupação foi logo argumentando: “Esses dias pra trás comi um pão com goiabada que me deixou passando mal; com muitos gases e uma dor estranha na barriga. Minha mulher também comeu, mas não sentiu nada".
Pedi que se deitasse, só mesmo para desencargo de consciência. Ao tocar seu abdome, senti uma massa volumosa, de consistência endurecida, em sua porção superior. Fiquei paralisado, atônito. Fingindo que continuava examinando, tomei tempo para pensar...
"Quê fazer? Pedir exame ou não? Investigo? O que acontecerá depois? Se algo de mais grave for diagnosticado e tratado, ele viverá mais ou menos?”. Eram quase 90 anos, e ele ainda transmitia vitalidade, excelente estado geral, e uma disposição de cuidado invejável para com sua companheira.
Com esses dilemas na cabeça, assinei a receita com alguns medicamentos para aliviar seu sintomas e solicitei um exame de imagem do seu abdome (que, confesso, torço para que não consiga fazer)...
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