PÂNICO
Chegou muito mal, acompanhada de seu pai. Ofegante, rosto pálido, demonstrando dor intensa e vontade de chorar. “Onde dói?”, perguntei. “No corpo todo, doutor”, respondeu apressada.
Fazia que ia desmaiar, vomitar, mas, milagrosamente, se continha. Era uma jovem de 27 anos. Seu coração batia na montaria de um cavalo, e o ar parecia não descender direito até seus pulmões; toda sua figura parecia afogar-se em seu próprio ser angustiado.
Exame físico sucinto; pedi que se deitasse. Saturação ok, pulmões limpos, ritmo cardíaco regular. Tudo indicava ser uma crise de ansiedade. Peguei umas agulhas de acupuntura e rapidamente estimulei alguns pontos. Pus um barulho de chuva caindo de música ambiente e exortei que fechasse os olhos.
Aproximei-me devagar e passei a comportar-me como se a conhecesse de longa data; como se soubesse de todos seus segredos mais íntimos. Apesar de seus gemidos e queixas, permaneci a seu lado, acariciando sua cabeça, e repetindo que tudo ficaria bem.
“Faz um esforço e tenta respirar profundamente”, solicitei. “Isssssssoooo...”.
Com voz mansa, pedi que esquecesse o mundo lá fora, deixasse de se preocupar com o futuro de seu corpo e mantivesse a mente retida somente ali, em sua respiração e no som da minha voz.
Ao cabo de 15 minutos, aos poucos, para minha alegria, ela foi se acalmando. Abriu os olhos, sentou-se puxando-me pela mão, e atuou como se voltasse de uma outra dimensão.
“Agora me conta. Me fala um pouco da sua vida...”.
“Sou uma menina que só vivo trabalhando. Mexo com limpeza. E agora fizeram um refeitório novo, grande; querem que eu limpe sozinha... O celular do meu marido foi roubado essa semana, dentro de casa! E minha casa foi assaltada há 2 dias; tentaram matar meu marido e meu filho de 6 anos. Estou com muito medo”.
Aos prantos, continuou... “Sinto muita falta do meu pai e da minha mãe. Porque, agora, moramos em quadras diferentes.... Meu marido está desempregado, e às vezes brigamos. Estou sem saber o que fazer ano que vem. Não aguanto mais ver ele dentro de casa. Para completar, meu filho de 2 anos foi diagnosticado com intolerância à lactose. Pesa muito ter de comprar esses produtos especiais, caros”.
Com o semblante menos tenso, prosseguiu. “Me sinto muito sozinha e não tenho ninguém para me ajudar.... Comecei a fazer faculdade de enfermagem, mas sofro muito para falar na frente das pessoas e apresentar os trabalhos".
“Ainda sonho com ter minha casa própria, minhas coisas, e ver minha família viver bem. Hoje moramos nos fundos da casa da minha sogra, que gosta de mim, mas vira e mexe me pressiona para pagar umas contas. Por que não pede para o filho dela?
“Eu vou para a casa dos meus pais e não me sinto mais acolhida; me sinto uma estranha. A irmã com quem melhor me relaciono mora em Goiânia; ás vezes, me liga e conversamos; me dá conselhos".
“Sabe... Sempre senti diferença no trato dos meu pais com minhas irmãs e, sobretudo, meu irmão mais velho. Minha mãe nunca valorizou minhas queixas, e acha que eu invento tudo. Sinto que sempre fui deixada de escanteio".
“Meu principal medo? Entrarem na minha casa e fazerem algo de ruim com meus filhos. Trauma na infância? Minha mãe me chamava de burra e falava que eu só servia para arrumar casa. Acordava, assustada, de madrugada, para fazer faxina...
“Outro dia fiquei bem magoada”, disse, com uma tonalidade na voz de ódio contido. “Ia fazer uma visita e meus pais disseram que não fosse, porque não tinham comida em casa, segundo eles... Mas eu não queria comida, nem nada deles! Só queria um pouco de carinho e atenção!”
Seu pai, que escutava, fazia de tudo para interromper nossa conversa...
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