BANHO DE SOL
Fosse em qualquer outro lugar do universo, seria um corredor. Mas, ali, na samambaia do avô roriz, era casa, e habitada por cinco almas; minúscula, imprensada, três cômodos, divididos por paredes branco-cal; sem portas. Num berço doado, uma bebê de dois meses, recém de alta do hospital: passara 30 dias internada por quadro de bronquiolite e pneumonia. Grave. No chão, colchão roído, colchas emaranhadas, pertences diversos, sem móveis. Da janela, vista do barraco ao lado, sem chance de circulação.
À memoria veio-me, imediatamente, a imagem de uma paciente que atendi anos atrás no quarto do fundo: caquética, pálida, lúgubre, tripas de fora, vítima de avançado de câncer de intestino.
Pedi licença para pegar a bebê no colo e leva-la até a calçada; sentia que precisava de ar. Dentro permaneceram a enfermeira e o agente de saúde orientando a mãe, sobre a necessidade de melhorar o ambiente para a criança. Mas, como?
Fazia um vento frio, mas o sol brilhava imponente – à nossa espera –; o céu estava despejado e azul. Arrimei um tamborete de madeira e sentei-me com ela no colo, resguardando-nos do vento atrás do portão. Ela abriu um sorriso discreto, quando sentiu o ar fresco e as primeiras centelhas da luz bendita acariciando sua pele. Devagarzinho retirei sua roupa, tentando não incomodá-la; a mãe logo garantiu-me que era seu primeiro banho de sol – que privilégio o meu!
Um detalhe em sua veste, entretanto, provocou-me encanto inesperado: meinhas diminutas que a mãe havia improvisado como luvas para protegê-la. Suas pequenas mãos desvendaram-se, e, de pronto, abraçaram com força um de meus dedos.
Aquecidos embaixo de deus, uma faísca de esperança senti, de carona em um dos raios de sol.

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