REMÉDIO PARA TRATAR REMÉDIO
Mulher, 63 anos, hipertensa, sedentária, acima do peso, com queixa de prostração crescente, dores e inchaço nas pernas, dor nas costas, dores de estomago, cefaleia constante, nervosismo, angústia e indisposição. Na prescrição anterior, que vinha seguindo há muitos anos, constava o uso contínuo de: losartana, atenolol, anlodipino, omeprazol, AAS, sinvastatina. Numa caixinha ao lado: vários analgésicos (dipirona, paracetamol, diclofenaco), que ela assegurava não fazer mais efeito, remédios para gripe e tontura...
Histórico clínico: sem outras comorbidades nem antecedentes de AVC, infarto ou outros eventos cardiovasculares.
“Veja bem. Na minha opinião, o primeiro que devemos tentar é evitar esse uso diário de analgésicos. Se realmente fossem a solução, a senhora já não sentiria essas dores que te incomodam constantemente. Esses remédios prejudicam o controle da pressão arterial, provocam dores de estômago, podem aumentar a frequência das dores de cabeça e prejudicar os rins. O omeprazol, quando usado durante muito tempo, pode piorar as dores de estomago, além de aumentar o risco de demência, osteoporose e anemia, tudo que não queremos no caso da senhora. O AAS (aspirina), que alguns médicos gostam de usar para prevenir infarto e derrame, na realidade não traz tanto benefício assim, e pode causar gastrite e hemorragias digestivas. A sinvastatina causa cansaço e dores musculares. O atenolol faz seu coração bater devagar. O anlodipino provoca inchaço e sensação de peso nas pernas.
“Sério que esses remédios provocam tudo isso?”, indagou com certa perplexidade.
Perceba que a situação clínica da senhora só vem piorando, apesar de fazer o uso correto de todas as medicações recomendadas por diferentes médicos. A senhora limitou ainda mais suas atividades físicas, vem ganhando muito peso e sentindo dores praticamente todos os dias. Os remédios parecem estar te fazendo mais mal do que bem, não acha?
Isso acontece quando pretendemos tratar as pessoas por pedaços. As vezes nós médicos pensamos por pedaços e esquecemos de avaliar os efeitos globais dos tratamentos preventivos que recomendamos. Todos os remédios que a senhora vem usando são para prevenir futuras doenças. Nenhum foi prescrito para tratar qualquer doença específica no presente. São remédios para tratar fatores de risco. Mas cada medicamento que ingerimos traz consigo uma série de efeitos colaterais e interações medicamentosas. Às vezes os prejuízos e danos clínicos superam esses supostos benefícios, como no seu caso. E isso tende a piorar quanto maior o número de remédios tomamos e com a idade, pela diminuição de nossa reserva funcional.
Acho que temos de mudar a estratégia. Precisamos, de alguma forma, melhorar seu estilo de vida e diminuir a quantidade de remédios que a senhora toma diariamente. Temos que conseguir, ou pelo menos tentar, que a senhora saia mais de casa, melhore a alimentação e pratique alguma atividade física. Não adianta tomar esse tanto de remédio - para supostamente prevenir doenças - e não modificar o estilo de vida. É isso o que realmente vai diminuir seu risco de adoecer. Nós vamos te ajudar! Mas vamos nos preocupar mais com a senhora e menos com os remédios, tudo bem?
Seu semblante, abatido, de repente se iluminou!
Seu semblante, abatido, de repente se iluminou!
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